quarta-feira, outubro 08, 2003

É um herói português, concerteza

Paulo Pedroso está em Liberdade. Quatro meses e meio depois de estar detido no «Limoeiro» o deputado socialista saiu da prisão directamente… para a Assembleia da República, onde foi recebido pelos camaradas de partido como um herói.

Algo de podre se passa em Portugal. No meio de um escândalo original e grave ao qual a sociedade Democrática portuguesa nunca assistiu, criam-se heróis e fala-se demais. Paulo Pedroso declara-se inocente. Tem todo o direito de o afirmar perante os media. Porém, ele ainda é arguido de um processo que ainda está em averiguações. Não é culpado, como é evidente, mas é suspeito de culpa. Por isso, a sua atitude em ir para o Parlamento, a «casa» onde funciona o país político, estando à espera dele o Partido Socialista em festa que o recebe como filho pródigo, foi errada na nossa opinião. Além disso, ir para o Parlamento quatro meses e meio depois de estar preso? Ser a primeira coisa que faz? Algo está errado. Imaginemos, por hipótese, que Pedroso é culpado. Que em julgamento fica provado, sem margem para dúvidas, que ele abusou sexualmente de crianças. Nesse momento o PS sofreria um cataclismo. Ferro Rodrigues seria obrigado a demitir-se. Figuras históricas como Manuel Alegre, que hoje afirmou que a libertação de Pedroso «representa uma vitória do estado de Direito». Estado de direito. Uma ideia com um significado tão forte, com uma conotação de justiça para todos, é usada como uma espécie de tapete que todos utilizam. Onde está o estado de direito para aqueles que, numa instituição do Estado, foram violados e ficaram no silêncio do medo? Se Manuel Alegre estiver errado, se Pedroso for culpado, é o fim da sua carreira, como o será para todos os actuais dirigentes do PS. Aliás, tudo nos pareceu hoje uma espécie de «encenação». Os abraços, a chegada à Assembleia com o líder do PS à porta. A ovação. Tudo a pressionar os media e os juízes que julgarão o caso para a inocência do «delfim» de Ferro Rodrigues. Se têm tanta confiança na justiça – «hoje a justiça deu um passo importante e eu continuo a acreditar na justiça» (Paulo Pedroso) – deixem-na seguir o seu caminho. De contrário, até parece que Têm dela medo.
Ora, podem também não ter medo dela. Podem é querer ajudá-la. Aliás, façamos o exercício de imaginação contrária: o que acontecerá se a Justiça estiver errada? Se muitos daqueles que estão presos são mesmo inocentes (até agora são sempre inocentes, pois até provas concretas mostradas em julgamento são todos inocentes) o que será da justiça. Perderá toda a sua credibilidade. Durante anos e anos a impunidade voltará a reinar. Assim, podemos afirmar que o «processo Casa Pia» é uma faca de dois gumes. Alguém se irá cortar… Além disso, Catalina Pestana – a actual provedora da Casa Pia – afirmou recentemente que ainda hão-de haver mais prisões que serão um «cataclismo» para o país. Quem serão? Isto terá alguma relação com o adiamento sine die de Carlos Silvino? É um processo tão complexo.
E só nos faltavam agora heróis no Parlamento. Fazer de um caso destes um caso de heroísmo, mesmo que se prove que Pedroso é inocente, é de um mau gosto. Que mais virá aí? Tantas interrogações sem resposta já bastam. De todo este processo só esperamos uma coisa: que os culpados sejam punidos e os inocentes vejam ser-lhes feita justiça. Caso contrário, Portugal afundar-se-à cada vez mais.

Duarte SD