segunda-feira, dezembro 26, 2005

O fim da tempestade

As manhãs de inverno parecem mais claras nestes dias natalícios que rápido se acabam. O frio permanece, mas o céu sem nuvens transmite energia aos Homens, qual plantas da criação que precisam também deste elemento para sobreviver.

A cidade perdeu algo do seu encanto. Habituada a ser presenteada com água, escuridão e trovoadas nesta quadra, o granito dos seus edifícios não consegue absorver a luminosidade perfeitamente. Busca esta pedra a parca luminosidade de inverno – no verão já a teve de sobra – mas não o consegue, criando curiosos efeitos nas sombrias manhãs e nos luminosos finais de tarde nas ruas estreitas da baixa. Algo na atmosfera anda incerto.

Passeio-me, de tarde, por essas ruas indefinidas buscando uma luz sobre o amanhã. Pressinto que estes tempos que se avizinham serão os da verdade. Agora irei saber a verdade das vozes que ouvi durante a tempestade que acabou. Percebi desde cedo que as vozes que se levantavam mais alto no meio do pesadelo serão aquelas que mais rapidamente se arrastarão em breves e espaçados murmúrios. Saberei também quais aquelas que se irão apagar lentamente como uma vela. Daqui a anos talvez nada sobre delas. Nem a memória se graves ou agudas eram. E, quem sabe, talvez tenha a surpresa de continuar a ouvir algumas vozes que, apesar dos trovões ensurdecedores, agora libertas destes possam pela atmosfera calmamente vaguear.

A tempestade por que passei nada mais foi do que um pesadelo cor-de-rosa. Talvez agora, finalmente, se possam seguir os sonhos. Tenho direito a eles, como toda a gente, e sem brados a os ouvidos me aterrorizarem. Porque a matéria onírica também é importante para o Homem poder viver. E por mais tempestades que – como uma sinfonia de clamores e guinchos – hajam, eles não morrem.

1 Comments:

Blogger delusions said...

O texto é lindo... adorei mesmo..."A tempestade por que passei nada mais foi do que um pesadelo cor-de-rosa.Talvez agora, finalmente, se possam seguir os sonhos. Tenho direito a eles, como toda a gente(...)Porque a matéria onírica também é importante para o Homem poder viver. E por mais tempestades que – como uma sinfonia de clamores e guinchos – hajam, eles não morrem." Eles não morrem mesmo...Ás vezes até que dava jeito, mas não morrem...Morrem sentimentos, pensamentos, amores, mas sonhos não... Permanecem sempre connosco, e são vitais "para o Homem poder viver"...
Parabéns plo texto... Sou do Porto e tu?
beijinhos e bigada pelo comentário*Fica bem

8:51 da tarde  

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