O directo ou o vazio televisivo
Porque se faz um directo na Televisão? A resposta académica, dada nos cursos de comunicação, é que o directo é utilizado para demonstrar que a televisão não mente. Ela está ali, no terreno, a cobrir os acontecimentos. O jornalista está no sítio onde nós não podemos estar fisicamente. Seja esse local o virar da esquina de casa, ou o outro lado do mundo. O directo, dizem os entendidos, é uma forma de credibilizar o jornalismo televisivo. Mais, é a forma que a televisão encontrou para ser possível noticiar o que está a acontecer no momento. Um congresso de um partido. Uma entrevista urgente. Mas estes acontecimentos são relevantes para uma determinada Informação. Naquele momento os telespectadores, imaginam os jornalistas, querem saber o que se está a passar...
Ora, o problema é que o directo, no novo contexto da televisão comercial, se banalizou. Faz-se directo do mais irrisório acontecimento - um almoço feminino no dia internacional da mulher; ir para as ruas perguntar à população o que pensa sobre determinado assunto; saber as reacções populares no fim de um jogo de futebol, etc. Onde está a notícia aqui? Em nenhuma parte. A televisão precisa de encher um telejornal "normal" de pseudo-acontecimentos. E, como destruir a ideia de pseudo? Fazendo um directo. Ao vê-lo, o telespectador pensa que o "acontecimento" é importante. Está lá um jornalista. Está a acontecer - pensa. Porém, quantas vezes não é a própria televisão que encena o momento.
Certos países da Europa - aqueles que fazem o povo português sentir-se inferior - têm telejornais curtos. Meia hora no máximo. E transmitem toda uma panóplia de notícias: política, sociedade, economia, desporto, etc. Em Portugal os telejornais chegam a durar mais de hora e meia. E, como encher um telejornal? Muitas vezes com directos e "casos da vida". São cadeias de televisão que transformaram a informação em telelixo. Quase nada mostram de interesse. E, o que interessa, é realizado com o espírito de quem faz a nulidade que invade a grelha do telejornal.
Isto tem consequências, que a médio prazo podem ser graves. Decorre, desde há alguns anos, a discussão sobre o descrédito dos agentes políticos. As pessoas estereotipizam-nos. Julgam que todos são aldrabões. Que apenas lhes interessa o tacho. É verdade que há maus políticos. Mas aqueles que parecem não prestar - exemplo óbvio: Fátima Felgueiras - são criações da comunicação social. Fugitivos à justiça transformam-se em heróis. São eles que vendem a notícia, que criam o famoso "jornalismo de mangas arregaçadas". Que espaço há, então, para os bons políticos? E, já agora, para o bom jornalismo?
Questionado se via o telejornal da sua cadeia de televisão, Paes do Amaral, ex-dono da TVI, respondeu que aquele tipo de telejornal não era para ele. Preferia um estilo CNN. Mas, respondia ainda ele sobre o tipo de telejornal transmitido pela TVI, o papel dos media não é o de educar o povo... Um dia, talvez estas palavras sejam recordadas como o exemplo do pensamento económico televisivo português
Assim, é com telejornais recheados de directos de não-acontecimentos, que o telejornalismo se banaliza. Que a qualidade da informação decresce. Que o vazio televisivo se adensa. Excepções ainda as há: SIC Notícias. Faz só directos de acontecimentos. Mas será por conceber ainda um jornalismo credível, ou apenas porque sendo um canal de cabo com pequena audiência não suporta o custo dos tempos de satélite. A dúvida continuará a pairar.
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